sábado, julho 28, 2007

Olha o gás!



Isto é importante demais para não ser divulgado. Da coluna No Tipiti, do jornal Canal Aberto de ontem (27 de julho):

Susto -- A secretária do Meio Ambiente foi uma das que foram levadas para o Amazonas pela dona Petrobrás, semana passada, prumódiquê conhecer o campo de produção de gás natural da reserva de Urucu, às margens do rio Urucu. Disse a moça que ela voltou do Amazonas horrorizada com o que viu e ouviu em Urucu.

Reflexos -- Maria Inez, que já não poupava críticas ao projeto da base de processamento de gás de natural (BPGN) que a dona Petrobrás pretende levar adiante em Caraguatatuba e região, voltou de Urucu com o pé ainda mais atrás. Está convicta que a região localizada na divisa entre São Sebastião e Caraguatatuba vai se transformar em pólo petroquímico e que a expansão urbana daquela área vai explodir, assim como ocorreu, por exemplo, em Macaé (RJ) e até mesmo na região de Urucu, nos cafundós da região amazônica. Os reflexos de ambas as hipóteses vão ser graves, e não apenas em termos de meio ambiente.

Minúcias -- A secretária ilhoa do Meio Ambiente diz que quando se está dentro das instalações da Petrobrás, a pessoa sente orgulho de ser brasileira, porque a empresa detém tecnologia de ponta e não fica devendo para nenhum outro país. O grande problema está no entorno das instalações da Petrobrás, onde ficam visíveis as mazelas provocadas pela falta de comprometimento da empresa em termos do desenvolvimento sustentável das cidades onde ela desenvolve suas atividades.

Tamanho da coisa -- As sondagens feitas no campo de gás natural de Mexilhões – na Bacia de Santos – mostraram que a produção por aquelas bandas será gigantesca, muito maior do que se esperava a princípio. Em virtude disso, a Petrobrás já trabalha com a certeza que a BGPN de Caraguatatuba terá o dobro do tamanho previsto originalmente. Como a construção da BGPN será modular, a empresa já prevê, por enquanto, a construção de dois módulos na área onde se encontra a Fazenda Serramar. Isso algo em torno de 800 mil metros de área construída, o que equivale a 100 campos de futebol.


A questão fundamental é a seguinte:

A base de gás (BGPN) será construída de qualquer forma. O interesse regional de que isso não ocorra é apenas regional e não é unânime, o que significa que em hipótese alguma ele evitará o interesse federal (do governo federal, não do país, abstração esta que deixo para outra hora) de explorar a reserva de gás da Bacia de Santos e, enfim, instalar em Caraguatatuba a BGPN.

O fundamental é que a BGPN não seja instalada de qualquer forma, mas de uma forma que os danos sócio-ambientais sejam mínimos. Eu pergunto: é possível reduzir e evitar danos? Existe um meio termo entre a degradação sócio-ambiental que será alavancada com a instalação da BGPN e a condição atual, sem a usina?

Eu duvido que exista. E é exatamente isso que me preocupa e que dá a certeza de que a construção e o funcionamento da BGPN se dará em detrimento do meio ambiente. Talvez o destino do Litoral Norte seja mesmo ser um nova Baixada Santista; enquanto muitos pensam que isso se dará por causa do turismo predatório, ainda muito forte na região, eu temo que isso ocorra justamente pela presença de uma nova Cubatão. É fácil lidar com gente; com poluição patrocinada e regulamentada pelo Governo Federal as coisas são diferentes.

É possível que a região não seja totalmente prejudicada com a BGPN. A vocação turística do litoral norte, embora mal aproveitada, é bastante forte. Veja Angra dos Reis, por exemplo: a presença de uma usina nuclear não inviabilizou o turismo na região; ao contrário, ele continua acontecendo e Angra ainda é um destino interessante para muitos turistas -- não apenas àqueles que ouvem falar da Ilha de Caras.

Mas produção de gás é algo diferente. Uma usina de tratamento e processamento de gás, como a que se pretende instalar em Caraguatatuba, polui. Usinas nucleares, apesar de todos os riscos, são relativamente limpas. O Tebar, em São Sebastião, apesar de também oferecer riscos e ter causado problemas ambientais sérios sobretudo nos anos 80, é essencialmente um terminal para descarga de petróleo, atividade que não polui. A BGPN poluirá, e muito. A localização, ao pé da serra e a apenas 1km do Parque Estadual da Serra do Mar, dificulta a dispersão dos gases poluentes. Não se sabe ainda qual o efeito disso sobre a fauna e a flora do Parque.

Aparentemente a opinião da sociedade civil não terá qualquer peso no desenrolar dessa história. Talvez mais importante do que questionar a construção da usina seja questionar os riscos, os danos incontornáveis e a utilização dos royalties que virão.

sexta-feira, julho 27, 2007

Tudo é arquitetura



Meu artigo no jornal Canal Aberto do dia 20 de julho.

"Em Ilhabela, como em boa parte do mundo, quem determina o desenho da cidade são arquitetos e engenheiros. Ultimamente, dinamite e motoniveladoras têm sido mais importantes para a cidade do que atobás e guapuruvus. E os profissionais sabem disso, porquanto permitem que seus clientes definam a forma que um lugar terá em vez de lhes sugerir precisamente o contrário – que o lugar, em sua condição original, possa ensinar algo ao cliente e, em seguida, a toda a cidade. É justo que os profissionais ajam dessa maneira; o cliente é que paga nossas contas. Mas ar puro, sol e água limpa não são menos necessários do que os honorários de um projeto. A beleza austera de áreas urbanizadas não é maior do que a beleza espontânea de cachoeiras e florestas.(...)"

quarta-feira, julho 04, 2007

Enquetes



O Imprensa Livre conclui recentemente mais uma enquete que avalia uma gestão municipal do litoral norte. Até agora os resultados são os seguintes:

São Sebastião:
Ótima - 7,84%
Boa - 6,69%
Regular - 7,50%
Ruim - 8,07%
Péssima - 69,90%

Ilhabela:
Ótima 59,23%
Boa 1,47%
Regular 1,06%
Ruim - 0,73%
Péssima - 37,51%

Caraguatatuba:
Ótima - 20,63%
Boa - 25,94%
Regular 15,00%
Ruim - 7,50%
Péssima - 30,94%


...restando neste momento apenas Ubatuba a ser avaliada, entre as cidades da região.

Discute-se a validade destas enquetes. Ora, enquetes realizadas na internet jamais serão consistentes. Não se sabe quem está opinando e em que condições. Ainda que haja controle tecnológico adequado, que impeça que um internauta vote várias vezes, é muito difícil ter a certeza de que isso não aconteceu. Ademais, este nível de perfeição técnica é razoavelmente difícil, como havia demonstrado um amigo com grande experiência no assunto.

Tecnologias à parte, há também variáveis humanas, que não cabe discutir neste momento. Se há ou não manipulação dessas enquetes -- porque naturalmente elas são editadas e gerenciadas por pessoas --, eu não sei e dificilmente poderei provar isto ou aquilo. Talvez seja suficiente concentrarmo-nos naquilo que sabemos, isto é, nas limitações técnicas que invalidam qualquer enquete desse tipo.

Talvez o cerne da discussão seja de cunho jornalístico. Qual a importância de se realizar e divulgar uma pesquisa que não tem confiabilidade técnica e representatividade? Isto é, se enquetes realizadas na internet não valem como pesquisas de opinião, por que realizá-las? Para quê divulgar resultados que dificilmente corresponderão à realidade? Entraríamos aqui na questão da liberdade de imprensa e da ética jornalística.

Cada jornal é livre para divulgar o que quiser; esta é uma dos fundamentos da liberdade de imprensa. Por outro lado, a liberdade de imprensa não dispensa o jornal de garantir a veracidade das informações que divulga. E desta forma a liberdade de imprensa e a ética jornalística são o alfa e o ômega do jornalismo. Publica-se qualquer coisa, desde que seja verdade.

As coisas começam a ficar complicadas numa enquete lançada pelo próprio jornal, com métodos e técnicas no mínimo obscuros. Enquete, qualquer pessoa faz, qualquer veículo pode fazer uma pergunta, colecionar respostas e publicar os resultados. Não estará assim cometendo crime algum, não estará faltando com a ética. A falta de ética pode, contudo, estar não na enquete e nos resultados, mas em seus pressupostos.

Lembro de uma campanha contra o racismo lançada pela TVE do Rio de Janeiro. O repórter saía às ruas e perguntava: onde você esconde seu racismo? Tratava-se, neste caso, de uma pergunta profundamente ofensiva, porque pressupunha que o entrevistado era racista. Todos os entrevistados (os que foram mostrados), no entanto, demonstravam certo constrangimento diante da pergunta e as respostas deixavam claro que eles haviam caído na armadilha: simplesmente responder "em lugar nenhum, eu não sou racista" soaria hipócrita e pedante; assumir que é racista e dizer algo como "eu não escondo, eu sou racista" seria um tanto pior.

Claro que no caso de uma enquete de jornal estamos diante de uma situação muito menos crítica. Emitir uma opinião a respeito de uma administração municipal é bem diferente de opinar sobre uma atitude criminosa.

Supondo que os números mostrados acima estão corretos, seria fácil analisá-los, encontrando justificativas mais diversas tanto para beneficiar as gestões que foram avaliadas como para desmerecê-las. Não pretendo fazer isso. Tenho para mim que enquetes realizadas na internet são o que são: quase nada, um objeto que pode no máximo servir de base para pesquisas de opinião sérias. Como as enquetes do Imprensa Livre não levarão a outras pesquisas e não terão conseqüências importantes, deixo aqui minha sugestão: podemos voltar à nossa programação normal?

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A propósito, este tópico tem sido discutido no Orkut.